O que eu vim falar aqui foi sobre o sensacionalismo em torno do crime, aliás em torno de crimes em geral.
Na sexta feira, ultimo dia do julgamento, eu fui ao forum de Santana. Não, eu não fui até lá para levantar a bandeira da justiça, muito menos me acorrentar a uma cruz algemada clamando piedade divina.
Eu fui lá buscar minha irmã, jornalista que veio da Bahia cobrir o julgamento.
Estacionei o carro ao lado do forum e fui esperá-la la fora. Ela estava descendo pra me encontrar e eu não podia ficar parada na rua esperando. O homem do estacionamento tambem não me deixou esperar dentro do carro. Resultado, tive que pagar R$5,00 por 10 min de espera.
Fiquei ao lado do forum, encostada numa viatura da polícia e não acreditei na multidão.
Perguntei ao guarda o que era aquela gente toda, ele me disse que eram todos desocupados que só estavam ali para atrapalhar.
Concordei com ele e me afastei. Fui fumar junto a 4 donas de casa e prestei atenção ao diálogo travado por elas.
Pelo que captei, elas estavam ali desde cedo, tinham deixado tudo preparado em casa, até mesmo a "janta" e foram lá prestar solidariedade.
Segundo elas, duvidavam que eles fosse julgados culpados, eles eram "de classe média alta" e até mesmo o juri estava comprado.
Ainda segundo elas, o pai do Alexandre tinha "posses" e contratou os melhores "adevogados" do país.
Mesmo ciente da derrota, eles não iriam arredar pé dali, iriam ficar até o final, tinham se organizado para isso, para "dar seu apoio a mãe da menina".
Fico pensando que prazer mórbido essas pessoas sentem, como elas podem ajudar ou até mesmo prestar solidariedade à familia das vitimas?
Uma vez fui ao Rio e um amigo meu me perguntou se eu queria conhecer o lugar onde a Daniela Perez tinha sido assassinada.
Hellooooooou, como assim??? sim, isso pra ele era programa!
Outra vez eu estava passando numa rua do Morumbi e vi uma confusão, carros de policia e uma multidão na porta de um prédio. Achei que era algum milionário jogando dinheiro pela janela.
Não era. Na verdade era o prédio onde estava a Suzanne Richtofen e ela estava saindo pro julgamento.
Mais uma vez o povo clamava justiça.
Quando teve uma briga entre as polícias civil e militar aqui em SP, o confronto foi perto da minha casa, dava pra ver da janela, bem na rua do Einstein. Graças a Deus eu não estava em casa, estava bem longe na praia, era semana do saco cheio e as crianças não tinham aula.
Várias pessoas me ligaram pra saber, como se eu estivesse lá, vendo tudo em tempo real. A voz de decepção ao saber que eu estava a 230km de distancia era notável.
Eu já tive minha fase mórbida, lembro quando eu era adolescente e voltava da escola andando com uns amigos.Vez ou outra a gente parava no museu do Instituto Medico Legal e ficava lá, olhando cadáveres sem cabeça, partes de corpos e etc.
Lembro de uma cabeça que tinha num pote, era de alguem que tinha sido atropelado por um trem. Eu ficava lá, olhando aquele cabeção no formol, bocão dilatado, olhos esbugalhados.
Aquela imagem povoou meus pesadelos durante anos, até hoje lembro.
No mesmo dia do embate policial aqui nas redondezas, houve o desfecho trágico do caso Eloá. La na praia chovia cantaros, eu me prostrei em frente a TV e ví tudo na integra, como que hipnotizada pela voz do Datena. As crianças se assustaram, depois me disseram que, durante as 5 horas em que fiquei em frente a TV, eu só balbuciava coisa do tipo " não acredito" ou " que absurdo".
Pois é, as vezes tenho medo de mim mesma.
Medo que qualquer dia desses em me desloque pra porta de algum forum para acompanhar algum julgamento clamando justiça acorrentada numa cruz.
Acho que no fundo, todos nós temos um lado mórbido, obscuro.
Eu, as donas de casa do forum de Santana, meu amigo carioca e a vizinhança da Suzanne.